Jogos e Brincadeiras na Educação Musical

Jogos e Brincadeiras na Educação Musical

Os jogos e as brincadeiras na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental fazem parte do dia a dia da sala de aula. Por meio dos jogos e das brincadeiras é possível proporcionar uma infinidade de experiências à criança, além de, por meio destes, assegurar condições para que elas possam desempenhar um papel ativo, de modo a sentirem-se convidadas a vivenciar desafios, resolver problemas, construir significados sobre si, os outros e o mundo na qual está inserida.

A educação musical, área do conhecimento também presente na escola, se refere ao ensino e aprendizagem da música e pode valer-se de diferentes estratégias de ensino para alcançar seus objetivos: levar a criança a construir conhecimento musical e a interagir com o conhecimento musical construído pela humanidade.

O tema será abordado sob a perspectiva da psicologia do desenvolvimento humano, especialmente sob a ótica construtivista de Jean Piaget e Lev Vygotsky.

Perspectiva de Piaget

Na perspectiva construtivista de educação, a aprendizagem ocorre como um processo de construção, pela interação constante que o sujeito estabelece com o objeto (realidade) e com o contexto sócio-cultural no qual está inserido. A aprendizagem se dá por meio de ações que a criança exerce sobre os objetos, levando à construção de esquemas e de conceitos.

Em seus estudos, Piaget observou que o conhecimento se dá quando acontece um desequilíbrio quanto à conceituação de algo já conhecido. Ocorre então o processo de assimilação, quando a pessoa classifica ou integra um novo dado às suas estruturas cognitivas; depois, a acomodação, que é a adaptação ou readaptação do conhecimento adquirido em uma nova estrutura. A adaptação, então, é o movimento contínuo entre a assimilação e a acomodação, o que possibilita o indivíduo responder aos desafios do ambiente físico e social.

Podemos, então, dizer que o processo de conhecimento, segundo a concepção piagetiana, é fundamentado em um processo de equilibrações sucessivas que conduzem a maneiras de agir e de pensar cada vez mais complexas. É um restabelecimento do equilíbrio não como o anterior, mas como um novo equilíbrio num nível superior, funcionando como ponto de partida para um novo desequilíbrio.

Esse processo acontece numa ordem fixa, caracterizada pelos estágios de desenvolvimento. Cada estágio se caracteriza por uma maneira típica de pensar, constituindo uma forma particular de equilíbrio em relação ao meio.

Perspectiva de Vygotsky

Para Vygotsky, o desenvolvimento não pode ser entendido sem referência ao contexto social e cultural no qual ele ocorre. Ou seja, o desenvolvimento cognitivo não ocorre independente do contexto social, histórico e cultural. A construção do conhecimento é um processo de internalização de estruturas culturais de modos de pensar e agir, iniciada nas relações sociais, em que os adultos e as crianças mais velhas, por meio da linguagem, do jogo, do “fazer junto”, compartilham com a criança em estágio de desenvolvimento anterior ao daqueles, seus sistemas de pensamento e ação. Portanto, ao internalizar instruções, as crianças acabam por modificar suas funções psicológicas, tais como a percepção, a atenção, a memória e a capacidade de solucionar problemas.

O aprendizado e o desenvolvimento, segundo Vygotsky, caminham juntos, quer dizer, tudo que a criança aprende com o adulto ou com outras crianças vai se incorporando e transformando seu modo de agir e pensar. Assim, o autor formulou um conceito próprio dentro de sua teoria, essencial para a compreensão de suas idéias sobre a relação de desenvolvimento e aprendizagem, que é o da zona de desenvolvimento proximal.

A zona de desenvolvimento proximal abrange os conceitos de zona de desenvolvimento real e zona de desenvolvimento potencial. Zona de desenvolvimento real é a capacidade da criança de realizar tarefas de maneira independente, sem ajuda de outras pessoas, de acordo com a sua maturidade. Zona de desenvolvimento potencial é a capacidade de desenvolver tarefas com a ajuda de outras crianças ou adultos.

Sendo assim, Vygotsky define a zona de desenvolvimento proximal como “a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através de soluções independentes de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes” (OLIVEIRA,1998).

Para Vygostky, é na zona de desenvolvimento proximal que a interferência de outros indivíduos é mais transformadora. Nesse processo, é importante a ação dos colegas da turma e dos professores. O objetivo dessa intervenção de outros é “trabalhar com a importância do meio cultural e das relações entre os indivíduos na definição de um percurso de desenvolvimento da pessoa humana” (OLIVEIRA, 1998) não devendo ser encarada como uma “educação tradicional”.

O Jogo para Piaget e Vygotsky

Para Piaget e Vygotsky, os jogos são atividades lúdicas que a criança desenvolve, sendo que, em cada fase do amadurecimento da criança, o jogo tem suas características próprias e sua importância.

De acordo com os estudos de Piaget, em especial sobre a gênese do conhecimento, o jogo é tido como um processo de assimilação: “se o ato de inteligência culmina num equilíbrio entre a assimilação e a acomodação […] pode-se dizer que o jogo é essencialmente assimilação, ou assimilação predominando sobre a acomodação” (PIAGET, 1970).

Ao analisar o desenvolvimento do raciocínio, Piaget destaca a importância da vida social para a conquista da coerência interna e da objetividade, pois, por intermédio dos jogos e das brincadeiras, a criança tem a oportunidade de tomar consciência de si mesma e é aí que as trocas sociais acontecem, principalmente mediante a narração e a discussão, expressando- se, sobretudo com relação aos pensamentos dos outros (SILVA e LAUTERT, 2001).

Para Vygotsky, os jogos e as brincadeiras são de extrema importância, pois “o objeto que [a criança] usa nas suas brincadeiras serve como uma representação da realidade ausente e ajuda a criança a separar objeto e significado. Constitui um passo importante no percurso que a levará a ser capaz de, como no pensamento adulto, desvincular-se totalmente das situações concretas” (OLIVEIRA, 1998).

Sob o ponto de vista do desenvolvimento da criança, a brincadeira traz vantagens sociais, cognitivas e afetivas. Sob o ponto de vista psicológico, a brincadeira e o jogo preenchem uma atividade básica da criança, ou seja, são o motivo para a ação.

Os jogos e as brincadeiras, na concepção de Vygotsky, têm um importante papel, criando uma zona de desenvolvimento proximal na criança e proporcionando influência no seu desenvolvimento. A criança usa objetos concretos atribuindo-lhe outro papel. A situação é, então, definida pelo significado da brincadeira e não pelos elementos reais que aparecem. A criança se relaciona com o significado em questão e não com os objetos concretos que tem nas mãos (OLIVEIRA, 1998). Assim, “no brinquedo, a criança comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades da vida real e também aprende a separar objeto de significado” (OLIVEIRA, 1998).

Portanto, no brincar e no jogar, quanto mais papéis a criança representar, mais ampliará a sua expressividade, entendida como uma totalidade. Ela também constrói os conhecimentos mediante os papéis que representa, desenvolvendo-se nos aspectos lingüístico e psicomotor, além do ajustamento afetivo emocional que atinge na representação desses papéis.

No contexto da educação musical, a criança participa ativamente da construção do conhecimento através da ludicidade, do entendimento da linguagem musical e do discurso que a música como atividade expressiva humana apresenta.

Assim sendo, é possível desenvolver em sala de aula uma infinidade de jogos e brincadeiras musicais que levem a crianças a interagir com a linguagem musical, além de vivenciar desafios, resolver problemas, construir significados sobre si, os outros e o mundo que a cerca.

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Referências

BEYER, Esther. Tendências curriculares e a construção do conhecimento musical na primeira infância. In: IX Encontro anual da ABEM, 9., 2000, Belém. Anais… Belém: ABEM, 2000. p. 43-51.

DAVIS, Cláudia; OLIVEIRA, Zilma de. Psicologia na educação. São Paulo: Cortez, 1994.
DECKERT, Marta. Curitiba, 2003. Monografia (Especialização em Educação Musical e Regência de Coro Infanto-Juvenil). Escola de Música e Belas Artes do Paraná.

FONTANA, Roseli; CRUZ, Nazaré. Psicologia e trabalho pedagógico. São Paulo: Atual, 1997.

MOREIRA, Marco Antonio. Teorias da aprendizagem. São Paulo: EPU, 1999.

OLIVEIRA, Martha Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1998.

PIAGET, Jean. A construção do real na criança. Trad.: Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Zahar, 1970.

SECRETARIA MUNICIPAL EDUCAÇÃO/CONSERVATÓRIO BRASILEIRO DE MÚSICA. Música na escola: jogos e brincadeiras musicais. Rio de Janeiro, 2002.

SILVA, Djalma Oliveira; LAUTERT, Elin Lanius. Sociointeracionismo – Teorias que embasam o comportamento lúdico da criança. Revista do Professor, Porto Alegre, n. 66, p. 7-12, abr.-jun. 2001.

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